29 de dezembro de 2009

O plural de Pai Natal é Pais Natais

Este texto tem como único objectivo dar um modesto contributo para a divulgação, na blogosfera, deste plural. Apesar de o horripilante plural "pais-natal" ser insistentemente corrigido todos os anos pelos linguistas, nem os portugueses médios nem os media portugueses parecem aprender.

Pai Natal, que se escreve sem hífen, é uma expressão lexical (e não um substantivo composto, caso no qual teria de ser obrigatoriamente grafado com hífen ou, pelo menos, preposicionado), constituída por um substantivo (Pai) e um adjectivo (Natal). Como na língua portuguesa os adjectivos concordam em género e número com os substantivos que qualificam, então Natal passa a Natais quando Pai passa a Pais: Pais Natais.

Na minha opinião, mesmo que se tratasse de um substantivo composto (coisa a que estamos condenados), o plural continuaria a ser Pais-Natais, uma vez que não me parece que Natal, tido como substantivo, determine o substantivo Pai (é estranho usar o argumento "há vários pais, mas só alguns são natal", pois também se aplicaria da mesma forma: "há várias couves, mas só algumas são flor", quando o plural de couve-flor é, reconhecidamente, couves-flores). Contudo, admito discordância neste ponto.

A língua está viva, para o bem e para o mal.

28 de dezembro de 2009

E agora: função do amor na fenomenologia do eu.

Um homem pode alcançar tudo na solidão, excepto um carácter.
Stendhal

Descartes pôs em evidência a incontornabilidade da existência de um ser-pensante, pois mesmo que duvidasse metodicamente de tudo o que existia dava consigo mesmo a pensar, e isso era indubitável, pois era o próprio processo pelo qual ele podia duvidar. A isto corresponde, de certa forma, o facto inegável da existência do eu. Mas esse eu não é uma estrutura perfeitamente integrada, mas é, isso sim, uma estrutura balcanizada. Há uma identidade subjacente, mas a sua fluidez requer a influência dos outros. Esta é uma característica única do ser humano: a necessidade do outro para se definir e conhecer a si próprio. Ele não pode ter uma noção correcta de si próprio se não existirem outros que lhe mostrem (por uma espécie de mecanismo de feedback) como ele é. A asserção de Stendhal traduz a noção de que o nosso carácter nasce nas reacções dos outros a nós próprios. Isto implica que necessitamos dos outros para nos sentirmos completos.

Sentirmo-nos completos lembra-nos a ideia aristofânica da cara-metade proposta no banquete platónico. O ponto a que quero chegar é que o amor é a função através da qual nos podemos sentir completos. O amor permite um feedback contínuo, que funciona como uma confirmação permanente da nossa identidade própria. São, assim, necessários sempre dois para que haja uma completude identitária.

Pode ser assim entendido o conceito de um Deus, central à maioria das religiões, Deus esse que nos vê a todo o momento e nos ama. Ser visto significa que se existe, e ser visto por alguém que nos ama é receber os contornos directores daquilo que nós próprios desejamos intrinsecamente ser.

21 de dezembro de 2009

Os defeitos

Perceber o que as pessoas nos escondem é fácil, mas não leva a lado nenhum.
E Canetti


Para quê querer encontrar os defeitos da pessoa que amamos? É na idealização romântica que se constrói o nosso amor, procurar a desidealização é procurar a desconstrução e, por conseguinte, viver na desilusão.