26 de novembro de 2005

Vai dar uma, Curva


Confundindo uma salada de fruta com um chaparro, ANDRÉ CURVA viu o seu centro de adormecimento reflexo activado e, de súbito, cochilou la siesta em pleno lanche. O facto não é inédito em certa zona da topografia portuguesa austral, mas vem trazer uma nova achega científica no campo na neurofisiologia, tendo já António Damásio manifestado o seu interesse pelo fenómeno reflexo de hipovigília. Prova-se assim que os alentejanos, na sua maioria, têm hipersensibilidade sonorífera a determinados sonorigénios (partícula indutora do sono por inibição da substância reticular activadora ascendente, desencadeada pela lembrança de chaparro; neste caso, o sonorigénio é a salada de fruta). Outros sonorigénios são também conhecidos entre não-alentejanos que, a título de mero exemplo científico ilustrativo, aqui deixo: tertúlias do Bino, filmes de Manoel de Oliveira e da indústria Bollywood, aulas de História em Castelo Branco, palavra «futebol» e correlatos, bem como discursos do Mário Soares, sínteses de aulas de Análise Matemática no IST e descrições quotidianas por naturais da Covilhã. Sincerely yours, GE.

Anime



Estêvão, já saiu o novo episódio da série anime, onde a princesa dos cabelos de infravermelhos com olhos cibernéticos enfrenta, no ano 3005, o robocop japonês adoptado pelo samurai Y, e descobre que ele, afinal, é um filho expatriado do rei do planeta X12345 de Andrómeda!!! Weee...

Campanha pró-preservativo

O GE encontrou muito recentemente uma fervorosa apoiante da campanha pró-contracepção. A octagenária transeunte passeava-se trajando um preservativo gigante perto do Pingo Doce. Este acto puramente dimanado de uma ideologia moral dedo-em-riste bloquista, baseada obviamente na visão dissociativa do acto sexual, considerando como independentes as suas dimensões unitiva e procriadora, ia cantando «it´s raining condoms», enquanto distribuía panfletos dizendo «biologismo forever», «make latex not love» e «in the navy é que é!».

Em Busca das Estrelas Perdidas...


Depois de Agustina, o ambiente selecto do Mourense oferece-nos JEAN-PAUL SARTRE. Este parisiense «ganda maluco» desaparecido desde 1980, foi encontrado a reformular La Nausée, depois que conheceu Agustina no mesmo estabelecimento comercial. Acto contínuo, o absurdo vislumbrado por si para a vida converteu - em virtude de paixão à primeira vista - o pessimismo intrincado num optimismo tipo gajo, com subsequente passagem do ateísmo para o euromilhõenismo.
Além disso, parece ter em vista a conversão de
Les Mouches em As Melgas, tragédia grega que já não afirma o existencialismo na responsabilização única do indivíduo pelos seus próprios actos, mas o portuguesismo, mediante o qual os actos do homem são motivados pela mulher do vizinho, devendo a responsabilização recair sobre a liberdade de exibição das pernas e decotes.
Prevista ainda está a metamorfose da
La Putain Respectueuse em La Pute pas Respectueuse, obra dedicada à Linda Reis.
Aparentemente, a organização terrorista independentista argelina que o perseguiu terá motivado a sua fuga de Paris para Lisboa, uma vez que, para os argelinos, a europa acaba em Espanha, onde costumam jogar à batalha bombista com os independentistas bascos, em semanas de pura diversão.
Melhor do seu glaucoma, SARTRE tenta refazer a vida longe de Beauvoir, recebendo o aval e as boas-vindas do
sincerely yours, GE.

10 de novembro de 2005

Reflexão entre uma espiral de fumo - Sócrates e a aporia

O modo como os pitagóricos entendiam a matemática autorizava a crença de que existem realidades além do mundo sensível, realidades essas que constituem as «causas» determinantes do mundo que nos rodeia. A alma imortal tomou contacto com essas realidades antes de encarnar num corpo sensível, o que está na base da doutrina proposta pelo Ménon de que aprender não é mais do que recordar. Ménon é forçado a admitir a função heurística da aporia, ou seja, que o interlocutor de Sócrates se acha em melhor disposição para aprender, quando, depois de refutado, se dá conta da sua ignorância.

8 de novembro de 2005

A Saudade

Há uns anos, escrevi este artigo para o jornal da minha faculdade. Recentemente, encontrei num blogue de famoso bailarino o tema abordado, pelo que decidi reler o que tinha escrito: como concordei com o meu eu-jovem, aqui vai.

Diz-se amiúde “Longe da vista, longe do coração”. Ora este adágio encerra, e como é típico de muito senso comum que por aí anda à peia da inteligência, um desacerto. No grosso das vezes, a distância ou a ausência não levam ao esquecimento. Antes pelo contrário, quanto mais «longe da vista, mais perto do coração». A antítese à forma proverbial comum sai reforçada pela experiência. São precisamente as situações de distância ou ausência que mais aproximam aos sentimentos a memória do objecto pelo qual atiçam. Quem nunca sentiu saudade?

Assim escreve a Florbela do Livro de Soror Saudade o soneto: «Quantas vezes, Amor, já te esqueci, / Para mais doidamente me lembrar, / Mais doidamente me lembrar de ti! // E quem dera que fosse sempre assim: / Quanto menos quisesse recordar / Mais a saudade andasse presa a mim!» – bem manifesto que um amor não pode ser esquecido por vontade própria, tão-pouco sem vontade; e que a saudade é o mal da ausência física.

Lorca, no Diván del Tamarit, grafa «A erva cobre em silêncio / o vale pardo de teu corpo. // Já pelo arco do encontro / a cicuta vem crescendo. // Mas deixa tua lembrança. / Deixa-a sozinha em meu peito.» – confessando a dor de saudade e solidão pelo amor já morto e enterrado.

Ainda o vate mor de Portugal, o Camões das redondilhas Sobre os rios que vão, também o reitera: «e minhas cousas ausentes / se fizeram tão presentes / como se nunca passaram», o mesmo Camões que numa das canções mais belas que escreveu dizia assim: «Ah! Senhora, Senhora que tão rica / estais, que cá tão longe, de alegria, / me sustentais com doce fingimento!» – escrito na situação de desterro a que foi sujeito.

Essa emoção, nascida do conúbio da ansiedade com a esperança, da alegria e do sofrimento, persiste nas situações de afastamento. Qual a alma que já não a sentiu como se o próprio amor estivesse presente e inalcançável? Não será essa dor dilacerante consoladora a seu modo? – como se avivasse e, por isso, mantivesse viva a memória do fisicamente ausente; sendo que essa fosse a principal força para resistir ao degredo? O amor como o alento maior da esperança, que perdura memorado pela dor dilacerante.

Findo com a mais pura Ausência da Sophia, viva no Mar Novo, que na sua imagética extraordinária confessa bem o pesar que carrega um “exílio” e o quão desajustado e ingrato é o supradito aforismo popular: «Num deserto sem água / Numa noite sem lua / Num país sem nome / Ou numa terra nua / Por maior que seja o desespero / Nenhuma ausência é mais funda do que a tua.»

O Silêncio


Foi opinião unânime que ontem se assistiu a um dos diálogos mais belos dos últimos tempos, exponenciado ainda mais pelo deserto de ideias que tem sido, desde há uns anos, a televisão portuguesa.

A importância do silêncio veio à baila numa conversa entre o cardeal D. José Policarpo, Maria José Nogueira Pinto e António Pinto Leite, no programa Prós e Contras.

Escutar o silêncio é dialogar intimamente, com o mais profundo que existe em nós e que, no fundo, é o que nos torna singularmente humanos: diria, é dialogar com a nossa própria humanidade, nas suas dimensões de consciência ética, espiritualidade, angústia, reconhecimento de si. Barata-Moura afirmou que, a partir daí, cada um hipostasia, no campo da espiritualidade, o que quiser como interlocutor desse diálogo. O Cardeal Patriarca concordou (fazendo uma aproximação extraordinária dos meios introspectivos do catolicismo aos de outras filosofias), mas afirmou que esse interlocutor, para ele, «tem um nome e um rosto». Afirmou ainda que a intensificação desse diálogo é o que traz a fé e convidou humildemente Barata-Moura a orar com ele e a descobrir Deus nesse diálogo interior. Este reconhecimento de que o ponto de contacto entre Deus e o homem é o próprio homem e de que funciona pelos mesmos mecanismos introspectivos de qualquer filosofia, com a excepção da atribuição de um «um nome e um rosto» bem determinados e divinos, teve um efeito de humildade (o que, há muitos anos, não era de esperar na tradicional afirmação superior da Igreja, como notou António Pinto Leite) que, de facto, só pode emudecer qualquer um por falta de argumentos contraditórios lógicos. É, realmente, «o tempo em que a Igreja está a fazer as pazes com Portugal».

7 de novembro de 2005

As ervilhas e a numerologia


Descobri recentemente sou a reencarnação do James Dean. Não acreditam? Vejamos: ele nasceu a 8 de Fevereiro de 1931, no mesmo dia que o meu padrasto, mas 3 anos antes. Morreu a 30 de Setembro que 1955, o mesmo ano e o mesmo mês em que a minha mãe nasceu, mas a 3 de Setembro (logo aí: 3 anos antes; 3 de Setembro; dia 30; Setembro é o 9.º mês, que resulta de 3x3). Ora de 30 podemos calcular 3+0=3 (dia 3) e 30-3=27, que é múltiplo de 3 e que corresponde ao mês em que faço anos (Março). Ora eu faço anos a 22, em que 2+2=4 (James Dean morreu aos 24 anos), e 4-1 (primeiro e último número do ano em que nasceu Dean)=3(novamente o três, implicado na data de nascimento do padrasto, mãe e reencarnado). Claro que 3, foram os filmes em que Dean foi a estrela. Nada mais lógico, porque a matemática é o cúmulo da lógica (logo, o supra-sumo desta realidade tão «lógica»). É isto e gostar de ervilhas.

Em Busca das Estrelas Perdidas...

Mais uma parelha de famosos captados naquele que se tornou, nos últimos tempos, o café em voga dos círculos da alta cultura mundial: o Mourense. Desta feita, encontramos o casal de renome nobelisado Pierre e Marie Curie, que jogavam afincadamente ao SUDOKU com uma tabela periódica, entre uma nata com canela e uma meia de leite.

6 de novembro de 2005

Chá com paramécia


«Os grunhos estão sempre bem-dispostos e nunca sofrem, porque faz parte da ontologia do grunho não ter vida interior. Num restaurante de Lisboa, poucos dias depois do acidente de Chernobyl, ouvia-se um grunho a perguntar ao criado, enquanto abafava grossas gargalhadas: “Ouça lá − este cherne é fresco ou é ‘óbil’? Veja lá − é que no outro dia serviram-me umas lulas tão radioactivas que bastava mexer-lhes para apanhar o FM da Renascença!”
São os grunhos que inventam as “últimas anedotas” que se supõem prova irrefutável do génio humorístico português. As anedotas são as maneiras deles se sentirem superiores a alguém. Depois de as contarem, explicam-nas até à exaustão (“Cherne e óbil, Chernobyl, estás a ver? Foi aquele sítio lá na Rússia onde rebentou uma bomba nuclear, ou lá o que é”). Passada uma semana, contam-na novamente. (...)
Os piores grunhos são os grunhos educados à força. Aliás, a ciência probabilística demonstra que quando se persiste em deitar pérolas a porcos, durante um período de tempo relativamente longo, qualquer leitãozinho aprende depressa a fazer um colar.»
ibidem
De facto, o chá foi uma das grandes contribuições portuguesas à civilização europeia, quando D. Catarina de Bragança convenceu a corte de Carlos II de Inglaterra a tomar regularmente uma chávena de chá. Mas hoje, nem o cacau africano nem o café brasileiro, podem alguma vez compensar a falta de chá que cada vez mais se instala e contagia de King Kongs para cerebrozinhos gelatinosos de paramécia.

5 de novembro de 2005

Em Busca das Estrelas Perdidas...

Continuando esta rubrica esporádica das «Estrelas Perdidas», encontramos recentemente (hoje à hora do café pós-prandial) AGUSTINA BESSA-LUÍS. Bem sabemos que AGUSTINA ainda não é uma estrela perdida, mas dado o insólito da sua presença na vizinhança, parece-nos que merece lugar de destaque neste conceituado espaço, conhecido já por umas 5 pessoas! Apurámos então, à socapa e ouvido limpo de cera, que AGUSTINA é apreciadora do café Mourense, sito na Palma de Baixo, encontrando-se actualmente em pesquisa para o seu novo livro, de título ainda a decidir: «O Caracolitos do café», «Idoso Jeitoso e uma Palma(da)», «Eterno Retorno à Cafeína» ou «Vale uma caminhada até à Católica menos 0,25 euros no café?». Ainda em cogitação criativa, AGUSTINA não se decidiu também pelo enredo, podendo o protagonista desta nova novela ser «O Conde», numa história que gira em volta de um grupo de jovens que se tentam aproveitar da generosidade alheia, na hora de pagar os cafés pós-prandiais; ou sobre a vida de dois cães semivadios, um Pointer e um Pastor alemão, amigos inseparáveis que um dia são agredidos pelo Conde; ou sobre um incógnito octagenário, que parece viver nas redondezas, ao que Agustina deixa entrever “Não digo quem é, porque tenho vergonha e sou casada, mas afirmo que trabalha noutro café da zona e que o filho tem a mania das teorias.”

Chá com King Kong


Quem são os sem-categorias? «São os grunhos. Nem é caso para dizer “Vêm aí os grunhos!”, porque o aviso seria em vão. Em boa verdade, os grunhos já cá estão. O que é um grunho? É uma criatura que logrou escapar ilesa do choque civilizacional. Em termos Darwinianos dir-se-ia que, em tempos de crise de chá, a selecção natural favorece o afloramento explsivo dos velhos genes recessivos dos bárbaros. Um grunho é um bárbaro adequado à selvajaria contemporânea. Entre os leitõezinhos da Bairrada, irrompe hoje o grunho como se fora um javali. (...) Há muitos que invadiram os próprios palácios da alta cultura. Hirsutos e rotundos, loquazes e extremamente afectuosos, os grunhos são o pessoal da almoçarada e do “estás-mesmo-bom?”. Para quem tem chá, são a definição axiomática de gajo. Para quem não tem, são para além de gajos, porreiros. Quando alguém diz que alguém é um “gajo porreiro”, devia acender-se no “tablier” metal de qualquer indivíduo avisado, em grandes letras luminosas: “ACHTUNG! GRUNHO!” Continua.
ibidem

4 de novembro de 2005

Chá − para quem pensa que as 5h são as horas dos doughnuts (conselhos atrasados, mas sempre úteis)


«Para já, importa ressuscitar o conceito da categoria entre as camadas jovens. A categoria é a expressão substantiva do chá. Uma coisa pode estar bem feita, mas não ter categoria nenhuma. Muita poesia portuguesa contemporânea, por exemplo, é bem feitinha, mas não tem categoria. Ter categoria é parecer inaugurar um novo filão de taxinomia. (...) A categoria está para o bem-fazer, como o chá para o bem-comportar: são variáveis independentes que não têm obrigatoriamente de se tocar. Se, por acaso, se tocam, é a perfeição (Perfeição vem de perfazer.) (...) A boa-educação ensina-se, o chá não. A boa-educação pode conseguir-se por transfusão, mediante pessoa alheia. Mas o chá vem (ou não vem) de dentro − consegue-se somente por infusão. O grande perigo, neste momento difícil e sem chá que atravessamos, é a proliferação de uma nova categoria de sem-categorias.» Continua.
A CAUSA DAS COISAS, Miguel Esteves Cardoso